quarta-feira, 1 de maio de 2013

Grão de trigo


...no início era um grão.
Um insistente grão de trigo, largado na terra seca de um campo árido. Nem ele próprio acreditava em si mesmo. Não... seria tão difícil germinar naquele ambiente hostil, dia após dia surrado pelos raios de sol que lhe queimavam a pele e instalava a desesperança em seu coração a cada dia que surgia por detrás do horizonte, radiante, necessário, porém, ardente. Ela já tinha ouvido falar de chuva, uma substância que lhe alimentaria, que traria os nutrientes da terra e o ajudaria a germinar, lançar raízes, crescer forte. Ela ouvira falar de outros grãos de trigo que germinaram, e junto a outros mais, formavam campos belíssimos onde no final da tarde, ao pôr-do-sol, ostentavam uma paisagem dourada e dançavam num ballet coreografado pelo vento e pela brisa fria dos primeiros dias de inverno. Era isso que ele queria!! ser um trigo!! e não apenas um grão encravado, de futuro incerto e evolução duvidosa. Ele também queria participar daquela dança de início de inverno, queria saborear espaços ao seu redor e ao sabor do vento, como veleiros que se lançam ao mar conduzidos a alhures. Quanto mais desejava a chuva, mais a seca lhe castigava, e realmente parecia um castigo, tanto desejar, tanto querer e nada acontecer. Onde estava, então, a sabedoria do ditado que dizia  que bastava desejar muito e acreditar que tudo aconteceria? Era tudo que ele fazia, todos os dias... desejava... pedia ao Criador que lhe atendesse suas súplicas. O tempo foi passando e nada. Já não lhe importava mais se o dia amanhecia dourado ou cinzento. Ele só enxergava a terra à sua volta, olhos cabisbaixos, desiludidos. Deu de ombros e pensou "Que seja, Criador!". E resignou-se. E entregando seus pedidos ao Criador adormeceu. Os dias se passaram iguais. Ele ocupava seu tempo conversando com os outros grãos de milho e ajudando-os a resignar-se com todo aquele processo de ansiedade e imediatismo. Foi nos primeiros dias da primavera, que foi acordado por um barulho surdo, que fazia tremer o chão à sua volta, pois pequenino grão ele era. Chovia. Sentiu as forças brotarem de dentro de si, essas mesmas forças que sempre estiveram ali e a chuva tampouco o havia alcançado. Lançou raízes ao solo, seus pendões ao alto, e cresceu, altivo, renovado e feliz. Não aconteceu ao SEU tempo, mas quando lhe foi necessário. A vida lhe trouxe a chuva que ele tanto ansiou, mas somente lhe derramou as gotas renovadoras sobre sua alma de trigo quando esse soube pacientemente esperar que a porta certa se abrisse. Ele fez sua parte, pediu, esperou, lutou segundo suas forças e capacidades, e no momento certo, que a vida escolheu, recebeu enfim a paz em seu coração. 

Lelo