sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Dente-de-leão

...Ele sentou-se à beira daquela rocha e com seus olhos cansados, perdidos, contemplou todo aquele vale que se estendia até onde a terra se encontrava com o céu. Escalou os 5 mil metros daquela montanha (que não era a maior, mas como desafio, para ele, era). Em seus olhos podiamos ler o entardecer, velando a cor-de-mel em um castanho escuro, refletindo a parca luz dourada do astro rei que já se debruçara por detrás da linha do horizonte, deixando à mostra somente sua luminosidade que transformara aquele céu azul em um teto alaranjado com rajadas vermelhas, anunciando uma noite fria que viria a seguir.

O caminho de subida não fora fácil com todos os pedregulhos, trilhas íngremes, vegetação fechada, espinhos lhe ferindo a carne, cortando sua pele até sangrar, os pés cansados e maltratados pela trilha rústica e repleta de pedregulhos que vez ou outra o faziam escorregar e tropeçar, sobrecarregando as articulações do joelho e por vezes tendo que se apoiar para não cair devido ao peso de seus apetrechos de escalada. Mas à medida que subia, seu pensamento se concentrava na paisagem à sua volta. A vegetaçã de árvores altas e frondosas, espalhavam o verde e deixavam passar por entre suas folhas os insistentes raios de sol que as alimentavam e alcançavam as menores e rasteiras vegetações que não conseguiam se erguer até as nuvens para que banhassem naquele calor aconchegante e dourado.

     Ali sentado, consigo, não entendia o porque de muitas coisas... nem poderia, afinal a vida é para ser vivida, não compreendida. As nuvens, tocadas pelo vento, vagavam ao sabor do mesmo, não sabendo onde iriam parar (ou se iriam), afinal, destinos são onde desejamos ir e não outro lugar, pois é nosso coração quem nos impulsiona e dita nosso rumo, soprem ventos ou não.

     A noite começava a transformá-lo em silhueta, ali, sentado à beira daquele abismo, com as pernas penduradas no vazio, que agora já não permitia mais diferenciar quase nada além do breu desolador e ao mesmo tempo encantador com o tapete de estrelas que já começa a se formar, permitidas pelo ocaso que comprimia seu peito. 

     Colheu um dente-de-leão que estava ao seu lado, estendeu-o em direção ao vazio e soprou... sentiu-se um Deus naquele momento, determinando quem fica, quem vai, dando destino a cada uma daquelas plumas que soprara rumo ao desconhecido. Da mesma maneira, atirou uma pedra no vazio, mudando todo o destino daquela pedra. Era para ela ficar ali mesmo ao seu lado ou para que cumprisse seus dias de pedra lá embaixo? ele não sabia, mas atirou assim mesmo. Era sua vontade, afinal. Não importava o que a pedra quisesse (ou sentisse, se pedras sentissem... ou quisessem) pois lá embaixo, julgava ele, ela teria outra vida(?) diferente daquela ali em cima, que já estava vivendo e aos seus olhos, ela não parecia uma pedra muito feliz, então só há uma alternativa (e ele aprendera isso com muitos sofrimentos na vida) para que pudesse ser feliz... fazendo as coisas diferentes do que já fizera até então. Só obtemos resultados diferentes se fizermos (e tentarmos) as coisas de maneira diferente, senão obteremos sempre os mesmos resultados e aquela pedra, definitivamente, já tivera sua vez e sua oportunidade (e não rendeu frutos).

     Engoliu seco, cerrou os olhos numa tentativa insólita de enxergar algo adiante ou à sua volta, mas nada. Apoiou-se no antebraço, erguendo levemente seu corpo no ar, projetou-se um pouco adiante e se perdeu na escuridão do nada.