** Amigos leitores. Para melhor compreensão da temática desse texto, por favor leiam o conto publicado aqui no meu blog intitulado "Ah! Veruska!" o qual narra a problemática de origem. Muito grato.
Raul.
O show durara cerca de
uma hora e meia. Entre beijos e abraços Raul assistira ao espetáculo ao lado de
sua amante. Michelle era seu nome. Saíram conversando animadamente e foram de
táxi até o hotel no qual Raul se hospedara, tendo o cuidado de registrar-se com
outro nome. Raul pediu que servissem champanhe e morangos. Como em uma noite de
núpcias, Raul tomou michelle nos braços e a carregou até o leito daquele quarto
de hotel.
O sol já estava a pino
quando Raul e Michelle despertaram. Ele tateou à sua volta até encontrar seu
celular, que havia deixado no silencioso na noite anterior e conferiu as horas.
Já passavam das onze da manhã. Michelle ainda dormia, envolvida em lençóis, com
um braço repousando sobre o peito de Raul e parcamente cobrindo sua nudez com
aqueles lençóis de marfim.
Raul por alguns segundos
estranhou o fato de Veruska não ter ligado pois ela o fazia todas as manhãs,
principalmente quando ele viajava a trabalho, mas não durou mais que poucos
segundos sua preocupação pois logo em seguida Michelle se espreguiçara e Raul a
abraçou e sussurrou - Bom dia meu amor.
Enquanto a água da
banheira tornava-se carmim, Veruska gritava de dor quando a lâmina feriu o
nervo de seu antebraço, causando-lhe uma dor quase insuportável e seu corpo
quase saltou da banheira, suas pernas tremiam, seus pés contorcidos e
respiração contida, seu coração parecia querer saltar pela boca bombeando
freneticamente aquele líquido viscoso que mantinha a vida naquele corpo lindo,
que naquele instante contorcia na angústia, parcialmente submerso naquela água
turva e salgada pelas lágrimas.
Concluído o segundo
corte, Veruska respirava com dificuldade e sentia os primeiros sinais de
fraqueza em seu corpo. Por fração de segundos pensara em desistir daquele ato
mas o palco estava montado e a representação de sua vida tornara-se uma grande
tragédia da qual ela não desejava mais participar. Toda sua vida desfilou em
sua memória, desde sua infância, o colo de seu pai que a chamava de "minha
menininha", para o qual ela era absolutamente tudo em sua vida, os afagos
de sua mãe, o carinho dos amigos e o amor... deteve seu pensamento e o soluço
quebrou o silêncio enquanto sua vida escapava pelos pulsos.
Raul tivera um dia
agradável. Michelle acordara e preguiçosamente passaram o dia se amando naquele
quarto de hotel, onde Raul pediu que servissem o almoço e, mais tarde, o
jantar. Entre juras de amor eterno, promessas de pedir o divórcio, planos de
constituírem uma família e mudar de cidade para começar uma nova vida, Raul
despediu-se de Michelle, deixando-a em casa e retornou para a sua. Queria
surpreender Veruska dizendo que havia retornado no primeiro voo disponível.
Raul ainda amava Veruska
- e quem não amaria? - aquela doce mulher que tudo fazia por ele, mas Raul era
aventureiro, incapaz de ser homem de uma só mulher. Discursava a mesma história
para muitas, no entanto jamais teria coragem de separar-se de Veruska.
Ligou uma vez mais para
Veruska sem resposta, apenas caixa postal. Abriu a porta devagar e entrou
silenciosamente. Esperava encontrá-la no sofá da sala vendo tv ou devorando um
livro, haja vista que ela adora ler. Chamou-a pelo nome sem resposta.
Procurou-a pelos outros cômodos da casa sem sucesso. A casa encontrava-se no
mais completo silêncio e organizada como sempre fora. Tirou o paletó,
pendurando-o no cabide da entrada, deixou sua bagagem de mão sobre o tapete da
sala e subiu as escadas em direção aos quartos e biblioteca onde a procurou sem
encontrá-la, também.
Raul abriu
silenciosamente a porta do quarto que encontrava-se na penumbra, tendo apenas a
luz de um abajur de cabeceira. A cama estava arrumada e Veruska não
encontrava-se nela e no entanto não se ouvia nenhum ruído vindo do chuveiro.
Chamou Veruska pelo nome, sem resposta. Raul acreditava que Veruska o vira
chegando e resolvera esconder-se para surpreendê-lo como já o fizera por
diversas vezes, brincalhona que era.
Foi como um tiro no
peito, daqueles em que o projétil encontra diretamente o coração pulsante e o
faz parar. Se Raul o visse ao espelho, veria um espectro, pálido como se não
houvesse uma gota de sangue sequer para colorir sua tez. As pernas, imediatamente,
ficaram trêmulas e teve que se apoiar na maçaneta da porta para que não
desabasse no chão. A respiração cessou imediatamente, suas pupilas dilataram
bem como arregalou os olhos e suas sobrancelhas pareciam fugir de sua testa
enquanto suas mãos suaram frio e seu coração bombeava desesperado ao mesmo
tempo que ele o sentia quase saindo pela boca.
Quase mergulhada na
banheira, com seu rosto inclinado para o lado, apoiado na borda da banheira,
seus olhos semiabertos ainda pareciam cheios de vida, tão brilhantes e doces
eram. Seu rosto angelical, de nariz perfeito, demonstrava um sofrimento que
somente ela soube a intensidade. Sua boca impecável sustentava, ainda, lábios
um pouco entreabertos, certamente pela dor e pelos últimos suspiros entre
soluços. Raul mal conseguia ver sua pele alva, macia, exceto parte dos
delicados ombros que emergiam. Seus braços estavam submersos e seus cabelos
repousavam, sedosos, fora da banheira, exceto algumas mechas que grudaram em
seu rosto pois a janela estava um pouco aberta e uma brisa soprava
carinhosamente.
Raul soltou um grito
desesperado que mais parecia um grunhido que ecoou por toda a casa. Levou as
mãos ao rosto e desabou de joelhos ao lado da banheira onde, inerte, repousava
aquela que dedicou parte de sua vida àquele homem que desdenhou de seu amor e
não valorizou toda a dedicação que recebera. Por que?? - Repetia Raul, ainda
incrédulo com o bizarro quadro que se descortinava diante de seus olhos.
Curvou-se sobre a banheira, abraçou seu corpo já enrijecido e numa cena
patética, beijava seu rosto e seus lábios sem vida. Raul não saberia precisar
por quanto tempo ficou ali abraçado a Veruska tentando encontrar uma resposta
para sua mente perturbada e cheia de questionamentos. Tateando a mão submersa
de Veruska Raul percebeu que ela não usava a aliança de casamento e bem ao lado
da banheira, havia uma folha de papel. Raul apressou-se em averiguar do que se
tratava... era uma carta de Veruska.
"Raul.
Espero que seja você o
primeiro a ler essa carta e também a encontrar-me.
Não fique surpreso com o
desfecho de minha pobre vida pois você contribuiu em grande parte para tal e
tampouco vou desperdiçar seu tempo forçando-o a ler adjetivos de baixo calão
que, embora merecedor, não vou me rebaixar a tal ponto, uma vez que você tem
plena consciência de que és um cafajeste.
Eu dediquei toda minha
vida, desde que nos conhecemos, a tentar fazê-lo feliz, amado, desejado,
cuidado, acariciado em todas as vertentes do carinho, da entrega e do
companheirismo. Briguei com minha família, desafiei meus pais que sempre foram
contra nosso relacionamento e, principalmente, magoei meu pai, que nunca
aprovara nossa união, repetindo que não confiava em você e que cedo ou tarde me
faria sofrer.
Não sofri, Raul.
Sofrimento é pouco diante do que senti. Preferi tirar a própria vida a encarar
meu pai e dizer que ele estava certo e que você não valia o chão lamacento que
pisa.
Contempla-me Raul, pela última
vez antes de atirar-se nos braços daquela mulher com a qual foi ao show,
mentindo que iria para Buenos Aires. Sim, eu estava lá e presenciei boa parte
de suas cenas amorosas "meu querido".
Você, como tantos outros,
vão me julgar fraca por tomar a atitude que tomei, mas cada um conhece as
forças que habitam em si mesmos e cada qual ignora o louco que reside em nós.
Desejo que seja infeliz
Raul e que a vida lhe devolva em dobro cada lágrima de tristeza que derramei.
Eu vivi para ti Raul,
embora de tua vida, verdadeiramente, nem um minuto me dedicastes.
Não me despedi de
ninguém, muito menos de meus amados pais. Enviei-lhes uma carta pré-datada que
em breve chegará em suas mãos, contendo minha despedida àqueles que de fato me
amaram.
Veruska."
Raul, antes de comunicar
o acontecido à família de Veruska, pegou o celular e ligou para Michelle
contando-lhe, em prantos, o acontecido.
- Michelle, preciso de
você ao meu lado nesse momento tão doloroso.
- Raul, lamento
profundamente o acontecido, não desejava jamais esse desfecho.
- Eu também não queria
que fosse assim meu amor. Havia planejado me separar normalmente e continuar a
vida ao seu lado, me casando contigo.
- Raul, eu preciso lhe
contar algo. Eu também menti a você. Sou casada, amo meu marido, não tenho
intenção alguma de me separar dele e me unir a você Raul. Não pensei que você
estivesse falando sério quando disse que pretendia que nos casássemos. Todas as
vezes que não podia atender a seus telefonemas nem estar contigo era porque
estava com meu marido. Achei que você e eu fôssemos apenas um caso de
infidelidade de ambas as partes e nunca imaginei que você se apaixonaria por
mim como dizia estar. Sempre pensei que fosse apenas parte de seu discurso
conquistador. Lamento Raul, mas não devemos e nem quero mais lhe ver. O prédio
onde você me buscava era apenas um disfarce, nunca morei ali e vou trocar meu
número de telefone. Não quero me envolver de maneira alguma nessa tragédia.
Desculpe Se você se apaixonou por mim e eu não. Seja mais cuidadoso com seus
sentimentos Raul. Até nunca mais meu querido.
- Michelle!! não desligue... Michelle!! ... Michelle!!!
“Experimente lançar uma taça de
cristal ao chão, depois peça desculpas e perdão e espere pra ver se os cacos se
juntarão e ela ficará como antes” (Frase de autor desconhecido).
** Em breve a carta de Veruska a seus
pais.
Lelo.
Infelizmente existe milhões de Raul por esse mundo! Não valorizam que tem de mas valor, sua FAMÍLIA.
ResponderExcluirUAU!!!! Veruska decidiu morrer... E Raul teve o que merecia... Que trágico! Acho que, numa continuação, aquele tiro metafórico no peito se concretizaria.... rsrs MUITO BOM!!!
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