terça-feira, 13 de agosto de 2013

Onde moram as lembranças...

...o sol se debruçava sobre o horizonte, dourando as folhas do bordo de Stanley Park. Vancouver se preparava para os burburinhos noturnos, o rock frenético nos pubs, a chuva fina e característica daquela cidade deslumbrante refletia os últimos raios de sol daquele domingo que se estendera como um discurso facundo e triste.
     Ele chegou em casa, deteve-se por instantes ao portão da garagem, desligou o motor, desceu, olhou à sua volta e com o olhar triste, lembrou-se do dia anterior quando ela ficava ali lhe aguardando. Ela veio visitá-lo e ficaram juntos toda a semana. Almoçavam juntos todos os dias em um restaurante próximo a seu trabalho, para onde ela se deslocava todos os dias e o aguardava. Era quando seus olhos brilhavam, quando encontravam os dela, ali, aguardando-o com aquele sorriso bonito. Caminhavam juntos, atravessando todo o parque, sob a chuva fina e a brisa fria que anunciava o fim do outono e a chegada do inverno que logo alvejaria toda a paisagem com as camadas espessas de neve e, nesse ano, prometia ser mais rigoroso.
     Mesmo que o inverno os surpreendesse, não haveria neve suficiente para congelar o calor daquele abraço, daqueles lábios, daquele corpo macio e de contornos generosos que se fundiam ao seu em todas as noites que dormiam de conchinha, com seu braço sob sua cabeça e o outro a lhe envolver pela cintura, acariciando-a levemente, com um roçar de unhas que subiam pelas suas coxas até seus seios e retornavam suavemente seguindo sua geografia, até adormecerem. 
     Quando criança, ele morava em uma casa com quintal, muitas árvores e em particular gostava de observar uma delas na qual os pássaros contruíam seu ninho durante o verão. Carregavam os gravetos e trançavam os mesmos com paciência, ocupavam o ninho até o inverno e depois o abandonavam. Ele começava a enxergar sua vida amorosa como esses ninhos, ocupados temporariamente até que um inverno, seja na alma ou nas circunstâncias lhe despejava e o forçava a mudar-se dali... e perguntava-se: até quando?.
     Não foi fácil, naquela manhã de domingo, acompanhá-la até o aeroporto, mas ele queria ficar ao lado dela até o último instante do embarque. Ela despachou a bagagem, na qual guardara também lembranças, saudades e metade dele que ali partia junto. Ele não quis esperar para vê-la dirigindo-se ao embarque, preferiu ir embora, guardando na lembrança apenas o momento em que ela chegara, de sorriso lindo, lhe abraçando apertado e beijando-lhe os lábios, chegando naquele momento e partiria em uma semana, deixando seu perfume em seu travesseiro e seu coração.

4 comentários:

  1. Lembranças...boas lembranças ficam.
    E o cheiro...ahh...o cheiro que teima em ficar no travesseiro...

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  2. talvez ela tenha sentido a mesma dor da partida... talvez tenha se perguntado até quando os ninhos temporários fariam parte de sua vida... talvez ela tenha sentido que aquela semana foi simplesmente a melhor em muitos anos de sua vida...
    texto lindo... parabéns!!!

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  3. É uma delícia ler seus textos... É um aconchego....

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  4. Na minha adolescência eu era viciada nos romances "Sabrina", "Júlia" e "Bianca". Esses livros eram vendidos nas bancas de jornais. Eram histórias de amores "quase" impossíveis, o autor relatava sob a óptica da "mocinha". Geralmente ela se apaixonava pelo "vilão", eram homens altos, fortes, viris, ricos,poderosos, mulherengos, gostavam de provocar a mocinha, deixando-a confusa... os autores relatavam detalhadamente cada situação, o lugar, os personagens, as emoções...depois de muitos encontros e desencontros, ela descobria que ele não era tão vilão assim e os dois se declaravam apaixonados, enfim tudo era esclarecido e terminava sempre com final feliz.
    Eu simplesmente devorava cada palavra, quando pegava um livro desses e começava a ler só parava quando terminava (+-200 páginas)... Sonhava um dia encontrar um homem como aqueles descritos nos romances... kkkkkkkkkk. Cheguei a me deparar com um, mas não era pra mim, infelizmente.
    Sabe, seus textos me lembram muito aqueles romances e me fazem reviver aqueles velhos e bons tempos... e eu me sinto como se tivesse novamente 16 anos! Foi uma fase maravilhosa da minha vida. Muito obrigada e parabéns!!!

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